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O SUS: esse milagre cotidiano que o brasileiro só valoriza quando o rim para de funcionar

  • 18 de abr.
  • 4 min de leitura

Imagine um país tropical, abençoado por Deus e governado por planilhas — onde quem nasce pobre já começa a vida com duas opções: morrer rápido ou brigar com o sistema. Agora imagine esse mesmo país oferecendo um sistema de saúde gratuito, universal, que atende da vacina contra sarampo ao transplante de fígado, passando pelo parto humanizado, tratamento de câncer e atendimento em acidente de moto (patrimônio nacional).


Sim, minha flor, isso existe. E chama-se SUS – Sistema Único de Saúde. Que de “único” não tem só o nome, mas a raridade mesmo: é um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo. Mas, como tudo que funciona no Brasil sem cobrar mensalidade, o SUS é tratado como aquele parente sábio que mora longe: só lembram dele quando a coisa aperta.

Todo mundo mete o pau. Até precisar.

O brasileiro adora fazer piada com o SUS. Ri do tempo de espera, do prédio caindo aos pedaços, do médico que atende 87 pessoas antes do café. Mas esquece de rir de si mesmo quando se entope de paracetamol por conta própria, ou corre pro hospital público depois de um "tratamento alternativo com babosa e fé".

Enquanto o plano de saúde particular te cobra os rins pra cuidar do fígado, o SUS segue firme, mesmo sucateado, mesmo sabotado, salvando vidas — inclusive de quem vota em gente que promete "privatizar tudo isso aí".


Não é perfeito. Mas é nosso.

O SUS é como o samba: nasceu do povo, apanha todo dia, mas nunca deixa de bater no peito. Não é eficiente porque falta verba, gestão e, convenhamos, vergonha na cara de quem corta orçamento como quem corta a fila no pronto-socorro. Mas mesmo assim, vacina milhões, faz campanhas de prevenção, garante acesso a medicamentos de alto custo, e atende uma pandemia com mais dignidade do que muito CEO de hospital de luxo.

Aliás, vale lembrar: foi o SUS que vacinou o Brasil inteiro contra a COVID-19, enquanto tinha gente comprando cloroquina como se fosse bala Juquinha.


O problema nunca foi o SUS. É o Brasil que não se trata.

Enquanto a elite acha que saúde é um produto e não um direito, e políticos usam o sistema como vitrine (ou cortina de fumaça), o SUS segue. Resiliente. Resistente. Revolucionário. Um projeto de país que insiste em existir mesmo que o país às vezes esqueça de existir por ele.

Então da próxima vez que alguém vier com papo de que “o SUS devia ser privatizado”, ofereça um espelho e uma passagem só de ida pra realidade. E, claro, um bom texto — esse aqui, por exemplo.




O SUS e o inconsciente coletivo: uma análise de divã para um país neurótico

Se o Brasil fosse um paciente, ele estaria deitado no divã com crise de identidade, complexo de vira-lata e um recalque profundo contra tudo que é público. E no centro desse conflito edipiano mal resolvido, ali está o SUS — símbolo de um ideal que o ego coletivo insiste em negar.


Na perspectiva psicanalítica, o SUS é o superego de um país que tenta ser civilizado, mas que vive agindo sob os impulsos mais primitivos do id — aquele lado que quer resolver tudo com tiro, cloroquina e opinião de WhatsApp. O SUS, então, aparece como essa instância moral que tenta segurar a barbárie, que insiste na ideia de cuidado, prevenção, comunidade e vida digna. Uma utopia? Talvez. Mas uma utopia que salva 190 milhões de egos feridos todos os anos.


O brasileiro, por sua vez, vive em negação. Reclama do SUS com raiva, mas a raiva é só uma defesa contra o sentimento de impotência. Freud já dizia: "quando a dor é insuportável, a mente mente". Então o sujeito projeta no SUS todos os seus ressentimentos: do abandono paterno à espera de 4 horas no ambulatório. No fundo, ele sabe que precisa do SUS. Mas como não consegue lidar com a própria dependência, ataca aquilo que mais o sustenta. É o clássico mecanismo de defesa: desprezar o que mais se teme perder.


E se formos olhar por Lacan — e porque não?, já estamos bebendo mesmo — o SUS é o “Outro” com letra maiúscula. Aquele grande Outro que organiza o simbólico: representa a Lei, a Ordem, o cuidado institucionalizado. O brasileiro neurótico quer ser livre do Outro, mas sem ele, se perde na própria angústia. Por isso, ataca o SUS como se fosse uma mãe sufocante, mas corre pra ele como uma criança febril que não quer morrer sozinha num corredor.


O que temos, no fim, é um sistema de saúde que carrega nos ombros o delírio coletivo de um povo que não sabe se ama ou odeia o que tem — típico caso de ambivalência afetiva, muito comum em relações abusivas. O SUS apanha, mas não revida. Ele cuida, acolhe, vacina e trata. Até de quem chama isso tudo de "gasto".

O SUS, minha cara, é o analista que nunca te abandona — mesmo quando você finge que não precisa de análise.

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