Turismo Espacial: o novo brinquedinho caro para bilionários entediados (e descolados da realidade)
- 16 de abr.
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Ah, o ser humano... sempre sonhando alto. Literalmente. Não bastava destruir o próprio planeta — agora querem fazer check-in no espaço. Isso mesmo: o turismo espacial chegou. E não, não é ficção científica. É só capitalismo em estágio terminal com síndrome de grandeza.
Enquanto metade do mundo se pergunta se vai ter arroz até o fim do mês, a outra metade (a que tem nomes como Bezos, Musk ou qualquer outro som de vilão de desenho animado) está financiando foguetes para ver a Terra de camarote por quinze minutos. O roteiro? Subir, boiar um pouco, tirar selfie flutuando com uma bandeira cafona e voltar — como quem vai ao mercado comprar leite, só que gastando o PIB da Guatemala.
Mas qual o problema? O dinheiro é deles!
Ah, minha cara leitora, o problema começa quando a coisa é vendida como “avanço da humanidade”. Avanço de quê? Da nossa capacidade de ignorar os problemas reais aqui embaixo? Ou seria só mais uma cortina de fumaça chique para desviar a atenção das crateras (sociais, não lunares) que continuam se alastrando por aqui?
Críticos apontam que esse tipo de turismo é uma afronta à desigualdade. E, francamente, até quem não é crítico consegue ver isso. Uma viagem que emite mais carbono que uma cidade inteira em um mês, feita só para que um playboy possa dizer que “sentiu a imensidão do universo”. Quer sentir imensidão, querido? Vai encarar o vazio existencial de segunda-feira sem café. Muito mais barato e com risco mínimo de explosão.
Enquanto isso, a Terra arde, literalmente. Crises climáticas, fome, guerras, colapsos econômicos... e o que fazem nossos gênios bilionários? Constroem uma Disneylândia de foguetes. O espaço virou o novo quintal gourmet dos privilegiados — e com vista panorâmica para o desastre coletivo.
O turismo espacial é a epítome da decadência disfarçada de inovação. Um espetáculo caro, poluente e absolutamente inútil para a maior parte da população mundial. É a selfie definitiva do ego humano: flutuando sozinho num vácuo, cercado de silêncio, ignorando o barulho da Terra que grita lá embaixo.
Só não esquece de postar quando voltar — afinal, de que adianta ir ao espaço se ninguém curtir a foto?
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A pulsão de morte com traje espacial
Sob a lente da psicanálise, o turismo espacial é um retrato assombroso — e hilariamente trágico — da nossa compulsão por repetir o erro, agora em alta altitude. O sujeito contemporâneo, já exaurido de prazer e saturado de consumo, busca no cosmos uma nova forma de gozo. Mas não qualquer gozo: o gozo inalcançável, aquele que Lacan diria ser do Outro — ou, nesse caso, do espaço sideral.
Não satisfeitos em dominar a Terra (ou pelo menos destruí-la aos poucos), os nossos heróis do capital avançam rumo ao céu como se buscassem, inconscientemente, a mãe cósmica. Querem sair do útero planetário, mas, como todo bom neurótico, não sabem muito bem o que fazer com a liberdade quando conseguem. Então repetem a cena traumática: erguem uma torre fálica, penetram o céu (olha a metáfora), gozam em microgravidade e voltam correndo pra casa — com medo de encarar a verdadeira falta que os impulsionou até lá.
O espaço como projeção do vazio interno
Não é à toa que o espaço fascina tanto: ele é a metáfora perfeita do nosso vazio existencial. Um nada infinito, silencioso, escuro e indiferente à nossa insignificância. Só que, ao invés de encarar o próprio vazio no divã, o sujeito moderno o terceiriza — e paga milhões pra dar um passeio dentro dele. O ego inflado acha bonito dizer que “viu o planeta do lado de fora”, mas não consegue, sequer, ver o próprio umbigo sem um espelho de R$ 40 mil com tecnologia da NASA.
O turismo espacial, nesse sentido, é a defesa maníaca contra a angústia do real. É o ego tentando negar o desamparo primordial com um brinquedo que voa. É como se disséssemos: “Tá tudo bem, olha só como podemos sair do planeta, somos deuses agora!” — quando, na verdade, mal conseguimos sair de nós mesmos sem surtar.
Fugir da Terra é fugir de si
Por fim, é preciso dizer: o desejo de fugir do planeta é, no fundo, o desejo de fugir da condição humana. Do fracasso, da angústia, da decadência inevitável. Mas, como nos ensinou aquele velho misantropo elegante chamado Schopenhauer, fugir do sofrimento é, paradoxalmente, outra forma de sofrer. Ir ao espaço pra tentar escapar da miséria humana é como comprar um sofá novo pra esquecer que o prédio tá pegando fogo.